sábado, outubro 28

Intervalo Lúcido.

O bêbado é cidadão de sorte, quem diz sou eu mesmo e por experiência própria. Há muito tempo, quando ainda era solteiro, ia para a farra sempre acompanhado de dois grandes amigos, o Lucinho e o Pedro Sérgio. O Pedro é filho do melhor cordelista do Ceará, o poeta João Amaro (Jotamaro) falecido em 1993.
Numa dessas farras, fomos à Barra do Ceará, praia bucólica de Fortaleza, começamos a beber pela manhã e seguimos o dia todo, começamos com uísque, passamos pela cerveja e cinco horas da tarde os três passaram para a podre (cachaça).
A barraca que estávamos começou a cerrar suas portas e os chamei para adentramos o clube Forró do Povo, chamar de clube é cortesia, pois se fosse hoje seria conhecido como Risca faca.
Estava tão embriagado que assim que entramos no clube, não mais os vi, fiquei um pouco recostado à parede com uma vontade imensa de ir ao banheiro, mirei a entrada e segui em direção ao mesmo.
Após satisfazer minha necessidade fisiológica veio uma idéia a minha cabeça:
-Ora, já me perdi deles mesmo... Vou é dançar... A primeira mulher que passar na minha frente eu "agarro" e vou bailar.
Decidido a arrumar uma acompanhante, fui em direção ao salão e quase que inconscientemente, vi um braço feminino passando, puxei de lado e disse:
-Vamos dançar minha filha?
-Agora mesmo rapazinho...
Começamos o rastapé e não nos desgrudamos mais... E haja forró...
Quem bebe, sabe que todo bêbado tem um "intervalo lúcido", ele pode estar embriagado como for, mas tem um instante que sua consciência o adverte que é hora de ir para casa, pois pode estar fazendo besteira. Pois bem, isso aconteceu comigo, uma voz me disse:
-Macho... vai pra casa, já passa das oito da noite, tu tá sozinho, sem teus amigos... NEM SABE COM QUEM TÁ DANÇANDO!
Ao ouvir a voz de minha consciência parei a dança no mesmo instante, no meio do salão, dei um passo pra trás para visualizar melhor minha parceira de dança e.... Era uma senhora sexagénaria, cerca de um metro e meio de altura, toda descabelada e extremamente satisfeita com o "namorado" que arrumara.
Larguei a mulher alí mesmo e disse:
-Dá licença vovó que estou indo embora...
-Mas... Mas meu filho...
-Nem mais, nem menos... dê licença, arrume outra pessoa
Fui embora nas carreiras do clube e peguei o rumo de casa.
Ah senão fosse o intervalo lúcido... Imagine se demora mais cinco minutos?
Quem sabe hoje estaria casado com a vovózinha.

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